Por Felipe Gesteira
O lateral-direito Rafinha construiu uma carreira sólida no futebol internacional. Invejável, pode-se dizer. Poucos brasileiros fizeram tanto, conquistaram tantos títulos, consolidando um verdadeiro legado. No futebol alemão, é ídolo incontestável pelo Bayern de Munique, clube onde acumulou mais títulos. No Brasil, por onde passou e conquistou títulos, Rafinha é respeitado. O craque começou a carreira no Coritiba, onde decidiu também encerrar seu futebol. No meio do caminho fez a felicidade de torcedores do Flamengo e do São Paulo, além de ter alcançado também uma marca pela Seleção Olímpica. Neste último ano, infelizmente, sua carreira termina com uma mancha que poderia ter sido evitada por ambas as partes.
Eu sei que tudo no futebol é levado ao extremo, principalmente devido às paixões que o esporte fomenta e provoca, influenciando os ânimos de todos os envolvidos. Mas tentemos por um momento comparar o caso fazendo alusão ao ambiente corporativo. Imagine um estagiário que começou sua carreira em um banco como office boy – nessas horas percebo que revelo minha idade, acho que o termo está em desuso, talvez hoje em dia seja o equivalente a um junior -, depois ele ascende na profissão com uma proposta para trabalhar em outro banco, adiante sai do Brasil, acumula experiência internacional até tornar-se dirigente de um banco em um país europeu de economia sólida e volta ao seu país de origem no topo da carreira, com feitos e histórico consistentes, ainda ocupa espaços novamente no mercado brasileiro e, no ano em que decide se aposentar, entra em acordo para trabalhar por um ano naquele banco que lhe deu a primeira oportunidade. A presença desse profissional no ambiente corporativo que ali começou como junior e hoje é um sênior consagrado vale muito mais do que sua mera produção diária. Como ele se propôs a entregar metas como os outros da equipe, é natural que ponha a ‘mão na massa’ e trabalhe diariamente, mas não vejo esse aspecto como primordial.
É mais ou menos assim o caso de Rafinha no Coritiba. O jogador fez lá sua primeira temporada, saiu, conquistou o mundo, venceu tudo na Alemanha, depois foi campeão no Brasil por dois dos maiores times, decidiu encerrar sua carreira no Coritiba e, por um erro, teve o contrato rescindido.
Sem querer tapar o sol com a peneira, o erro deve ser abordado. Rafinha foi convidado para um jogo festivo pelo Bayern, na Alemanha e, segundo o Coritiba, viajou sem avisar. É claro que o atleta errou gravemente, mas a ponto de uma rescisão contratual? Rafinha contribui só por estar presente no elenco, junto aos jogadores mais jovens e à comissão técnica. Embora neste ano pelo Coritiba só tenha amargurado derrotas, por onde passou sua experiência deu resultado, empurrando seus respectivos times. Foi duas vezes campeão brasileiro (Flamengo), campeão da Copa do Brasil (São Paulo), duas vezes da Supercopa do Brasil (Flamengo e São Paulo), mais uma Libertadores (Flamengo) e uma Recopa Sul-Americana (Flamengo). Isso considerando os títulos nos quais ele teve papel fundamental como líder. Se puxar os do Bayern é mais uma carrada: Champions, Mundial, sete ligas, quatro copas…
Rafinha no Coritiba poderia agregar muito mais do que ser apenas um lateral-direito. A presença do jogador em campo melhora o nível técnico do time, e fora das quatro linhas, o peso de um multicampeão faz toda diferença em diversos aspectos. Ter Rafinha é bom para o futebol, no sentido até de mercado, para o marketing, para valorização da marca e até para formação e vínculo com a torcida. O erro, mesmo que grave, não está no patamar de algo imperdoável. Rafinha não praticou racismo, homofobia, violência contra mulher, nem teve uma conduta absurda fora de campo. Foi receber mais uma homenagem por tudo o que carrega, errou ao não ter acertado com seu atual contratante. Na rescisão, o Coritiba, duro em excesso, também sai perdendo.
Texto publicado originalmente na edição de 21.3.2025 do jornal A União.