Por Felipe Gesteira*
Quem mais sofre no Brasil assistindo aos jogos do Campeonato Brasileiro com certeza sofre menos que o torcedor do Botafogo. A essa altura da competição, terminado o primeiro turno, o botafoguense pode até gozar de certa alegria ao avistar seu time no topo da tabela. Equipe jogando bem, disputando as partidas com afinco, Tiquinho Soares voltando a ser decisivo. Mas aposto um dedo mindinho como no coração de cada torcedor paira um pinguinho de angústia.
O botafoguense sonha em ser campeão, mas vive a iminência do sofrimento. A mente do torcedor custa a se enganar, pois seu cérebro projeta cenários tenebrosos a cada vez que ele busca a ilusão do sonho. A dor da impressionante derrocada no final do ano passado após ter colocado as duas mãos na taça do Brasileirão ainda mantém feridas abertas.
Se você caiu neste texto por acaso e não gosta de futebol, provavelmente não sabe o que é sofrer por um time. Imagine, então, sofrer por amor. A pessoa que acaba de perder um grande amor mergulha num oceano de sofrimento. Esse cenário pode durar anos. Mas, cedo ou tarde, os dias cinzentos cessam e ela volta a ver o mundo colorido ao se deparar com um novo amor. Na nova fase, tudo é maravilhoso, até o ar que se respira enche os pulmões com mais propósito. Com o cérebro encharcado de neurotransmissores responsáveis pela sensação de felicidade, a pessoa nem lembra que um dia foi triste, até ser novamente. Sim, a vida é cheia de ciclos. E no próximo ciclo feliz, ao viver mais uma vez a sensação de felicidade plena, virá a lembrança do baque anterior, o medo que dê errado novamente, e assim muita gente entra em relacionamentos com o freio de mão puxado, antevendo que irá sofrer mesmo que o novo parceiro não lhe dê motivos para insegurança.
Mas o Botafogo não é o novo parceiro de uma vida amorosa, o Botafogo é um time que, além de maltratar, dá ao seu torcedor todos os motivos para insegurança.
Assim como no amor, é preciso viver a torcida de forma desprendida.
Dia desses encontrei um amigo muito querido que é torcedor do Botafogo. Como todos os outros, ano passado ele viveu o êxtase. Tamanha foi a euforia ante o título que comprou passagens e ingressos para assistir a um dos últimos jogos com seu filho. Não imaginava que o time fosse despencar daquele jeito. Aliás, quem imaginava? Viveu a emoção da arquibancada como pôde, e mesmo assim foi feliz. No nosso encontro, comentei que torci pelo Botafogo no último ano e perguntei qual era a sensação de ser líder agora após ter sido líder e sofrido uma perda inimaginável. Ele respondeu sereno, sorridente, até, e disse que estava feliz. “Bicho, o que era o Botafogo antes? Um time que corria o risco de deixar de existir! Hoje a gente tem perspectiva, vê o time jogando bem, tá bom demais”. O melhor do relato foi o sorriso de satisfação. Aquela satisfação de quem ama sem expectativa, um amor desconectado de qualquer insegurança. Glorioso.
*Artigo publicado originalmente na edição impressa de 26.07.2024 do jornal A União.