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ARTIGO: Bela chuva

Por Felipe Gesteira*

(Foto: Cristiano Santos/Botafogo-PB)

Já são 30 anos da morte de Ayrton Senna. Um dos maiores pilotos da história da Fórmula 1, ele tinha mais que habilidades como desportista. Tinha carisma de sobra. Não à toa o Brasil se ligava nas manhãs de domingo para torcer por Senna. Fosse um tão habilidoso, porém antipático, não teria reunido tanta torcida em favor de seu sucesso. O país acordava cedo para torcer por Senna como um ritual. Passar o café, ligar a TV, assistir à corrida. Senna pilotava carros inferiores e disputava de igual para igual contra pilotos que largavam em condições melhores do que ele por terem mais estrutura tecnológica e máquinas melhores. Talvez por isso o brasileiro se sentisse tão representado, era o herói que enfrentava o sistema, confrontava os ‘mais ricos’ e vencia, apesar das adversidades. Com a diferença que comparado à disputa de classes, o gargalo enfrentado por Senna era resumido àquele universo, pois o piloto nunca fora pobre. Alías, ninguém no automobilismo é pobre.

Um ponto que me lembra as manhãs de domingo era a dupla torcida, pois não torcíamos tão somente pela vitória de Senna, torcíamos também pelo mau tempo. Parece absurdo para os jovens de hoje que não viram Senna voando baixo, mas o torcedor brasileiro comemorava quando começava a chover durante a prova. De tão ruim no início da carreira quando se deparava com a pista molhada, Senna decidiu superar a adversidade treinando sempre que podia sob chuva. A partir daí tornou-se o mítico piloto que para seus fãs era quase invencível quando caía um pé d’água. Lembro da cena histórica no GP de Interlagos quando Christian Fittipaldi, já fora da prova, vibra ainda de dentro do seu carro quando percebe que começava a chover.

Senna não era abençoado sob chuva, só era mais preparado. Havia praticado mais e, no esporte, treino dá resultado. Embora quando caísse a chuva fosse para todos, a redução de tempo médio para cada volta devido ao cuidado para não sobrar fora da pista fazia com que a discrepância entre carros fosse menor, valorizando os pilotos.

O que serve para a Fórmula 1 não vale absolutamente de nada no futebol. Nunca ouvi falar de boleiro que esperasse chover para treinar no campo molhado. Da mesma forma, como chove para todos, quem está em campo só tem a opção de correr movido por suas próprias pernas, não são motores diferentes, com tecnologia e ajustes diferentes, que se equiparariam devido ao temporal. Dizer que um time se beneficiou da chuva é querer induzir o torcedor a um entendimento que reduza de forma injusta o mérito da equipe. Jogador profissional nenhum no mundo gosta de atuar sob chuva.

Para quem se enfrenta em uma partida de campeonato, bom mesmo é poder contar com a bola rolando. É por isso que a vitória do Belo na última segunda-feira (3) sobre o Athletic Club, pela sétima rodada da Série C do Brasileirão, foi mais do que merecida. Se ganhou sob chuva forte em João Pessoa, ganharia por um placar ainda maior se não tivesse chovido.

O que mais existe no meio esportivo é analista que constrói argumento com viés a partir do próprio umbigo. Se for contra o time, vai atacá-lo sempre; se for a favor, o defenderá, tudo isso independente de qual seja o resultado.

Sobre o jogo de segunda, o Botafogo venceu merecidamente. A belíssima chuva que lavou a alma da torcida presente no Almeidão jamais servirá de desculpa para diminuir a vitória do Belo.

Artigo publicado originalmente na edição de 7.6.2024 do jornal A União.